Crédito Rural: Oportunidade ou Armadilha? Entenda os Riscos Antes de Assinar
Com R$ 274 bilhões já liberados para a safra 2024/2025, especialistas alertam que, sem orientação técnica e jurídica, o crédito rural pode se tornar um peso insustentável para o produtor brasileiro

Em meio à pujança do agronegócio brasileiro, o crédito rural se apresenta como um pilar fundamental para o planejamento e viabilização das safras, mas também esconde riscos que podem comprometer a sustentabilidade financeira de produtores de todos os portes. Dados atualizados pela Gerência de Desenvolvimento Técnico do Sistema Ocepar (Getec), em conjunto com a consultoria Fator Agro, revelam que, até março de 2025, R$ 274,14 bilhões já haviam sido repassados via crédito rural, dentro dos R$ 476,6 bilhões disponibilizados pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) para a safra 2024/2025.
À primeira vista, os números impressionam positivamente. Porém, segundo especialistas, o crédito, quando mal contratado ou mal compreendido, pode se transformar em uma armadilha silenciosa — sobretudo em cenários de instabilidade climática, variação cambial e pressões de mercado.
Barter ou Financiamento? A Escolha que Pode Definir o Futuro da Propriedade
A advogada Márcia Alcântara, referência em Direito Agrário e integrante do escritório Celso Cândido de Souza Advogados, afirma que este é o momento crucial para decisões estratégicas. “Com o encerramento da safra anterior, o produtor entra num ciclo de decisões. Ele precisa saber se vai buscar financiamento bancário tradicional ou apostar no modelo de barter, que é a permuta de insumos por parte da futura produção. Cada escolha carrega seus próprios riscos e obrigações”, aponta.
Segundo ela, o barter — prática comum em diversas regiões do país — exige atenção redobrada quanto à qualidade dos insumos fornecidos, adequação ao tipo de solo e cultura, variação cambial (já que muitos contratos têm base dolarizada) e até mesmo à composição dos estoques das empresas fornecedoras.
No caso dos financiamentos bancários, os perigos são mais conhecidos, mas ainda negligenciados por muitos produtores: juros embutidos, cláusulas de difícil compreensão, venda casada de produtos, taxas disfarçadas e execução judicial de garantias sem ampla defesa.
Crédito Rural: Destinação e Finalidades
Os recursos do crédito rural são geralmente divididos entre custeio e investimento. No custeio agrícola, entram gastos com insumos, tratos culturais, colheita e armazenagem. Na pecuária, as despesas com nutrição animal, sanidade e manejo. Já o crédito de investimento mira na aquisição de tratores, colheitadeiras, melhorias em armazéns, silos e até aquisição de animais para reprodução ou corte.
Mas o que parece simples pode esconder custos ocultos. “Alguns contratos não deixam claro o valor da taxa efetiva anual. O produtor acredita estar pagando 8% ao ano, mas com encargos e tarifas administrativas, o valor real pode ultrapassar os 12%”, exemplifica Márcia.
Checklist de Segurança para Contratar Crédito Rural
A especialista orienta um passo a passo para mitigar os riscos:
- Verifique a instituição financeira
Certifique-se de que a empresa está autorizada pelo Banco Central a operar crédito rural. - Fuja da venda casada
O produtor não é obrigado a adquirir outros produtos ou seguros junto ao crédito. Denúncias podem ser feitas por meio da nova plataforma do Mapa. - Avalie o prazo de pagamento
O vencimento da dívida precisa estar adequado ao ciclo da cultura ou da atividade pecuária. Não se pode pagar a dívida antes de colher os frutos. - Analise a viabilidade do barter
Avalie tecnicamente se os insumos oferecidos atendem à sua necessidade produtiva. O mais barato pode sair caro. - Atente-se aos custos invisíveis
Verifique a taxa efetiva anual, tarifas operacionais, seguros embutidos e correções cambiais. - Contrate assessoria jurídica e contábil especializada
Contratos rurais, apesar de padronizados, escondem cláusulas que exigem interpretação técnica e legal.
A Nova Realidade das Denúncias de Venda Casada
A prática da venda casada continua sendo uma das mais recorrentes no agronegócio, especialmente em regiões menos assistidas por entidades de classe. Em resposta a essa distorção, o Mapa lançou em 2024 uma plataforma digital de denúncias anônimas, permitindo que o produtor registre práticas abusivas com segurança e agilidade.
Reflexão Final: Crédito Não é Dinheiro Fácil, É Compromisso
Com o endividamento rural ainda presente em milhares de propriedades — sobretudo entre médios e pequenos produtores — o crédito rural exige não apenas papel e caneta, mas também análise criteriosa, simulações financeiras e, acima de tudo, planejamento técnico e jurídico. “A pressa para garantir os insumos da próxima safra não pode atropelar a prudência. Um contrato mal feito hoje pode significar a perda da fazenda amanhã”, finaliza Márcia Alcântara.
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