STJ confirma multa a advogados por abandono de plenário no caso Valério Luiz
Corte reafirma que Lei nº 14.752/2023, que veda penalidades desse tipo, não retroage para invalidar atos processuais já consolidados. Decisão mantém punição aplicada após defensores deixarem o julgamento de Maurício Sampaio.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve, de forma unânime, a multa imposta a dois advogados que abandonaram o plenário durante o julgamento de Maurício Borges Sampaio, réu acusado de mandar matar o radialista Valério Luiz, em 2012. A decisão reafirma o entendimento de que a Lei nº 14.752/2023 — que proibiu a aplicação de multas a advogados por abandono de processo — não possui efeito retroativo e, portanto, não alcança atos praticados antes de sua vigência.
A penalidade havia sido aplicada pelo juiz da 4ª Vara Criminal dos Crimes Dolosos Contra a Vida de Goiânia após a defesa ter deixado o plenário no meio da sessão, alegando insatisfação com decisões do magistrado, incluindo a manutenção da lista de jurados sorteada e a rejeição de pedido de suspensão do julgamento. Como não houve justificativa capaz de caracterizar impedimento ou impossibilidade real de permanência, o magistrado aplicou a sanção prevista no artigo 265 do Código de Processo Penal, então em vigor, fixada em 100 salários-mínimos para cada defensor.
A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás ingressou com mandado de segurança em defesa dos profissionais, mas o Tribunal de Justiça de Goiás manteve a multa, destacando que a defesa poderia recorrer pelas vias adequadas sem comprometer o andamento do júri. Para o TJGO, o abandono configurou conduta arbitrária e incompatível com o exercício regular da advocacia no Tribunal do Júri.
No recurso ao STJ, o Ministério Público de Goiás, por meio da procuradora de Justiça Renata Silva Ribeiro de Siqueira, sustentou que a multa foi corretamente imposta, uma vez que o abandono decorreu exclusivamente do inconformismo com decisões desfavoráveis. O MP reforçou que a sanção tem natureza administrativa e, por isso, submete-se ao princípio da irretroatividade das leis, segundo o qual atos processuais devem ser regidos pela legislação vigente à época de sua prática.
Relatora do caso, a ministra Maria Marluce Caldas acolheu integralmente os argumentos do Ministério Público. Ela destacou que a jurisprudência da Corte é consolidada no sentido de admitir a aplicação da multa quando há abandono injustificado do plenário — sobretudo porque essa conduta compromete o andamento do Tribunal do Júri, que dispõe de dinâmica própria e depende da continuidade dos trabalhos. Ao analisar a questão da retroatividade, a ministra concluiu que a mudança legislativa não pode atingir penalidades já constituídas.
Com a decisão, o STJ manteve o entendimento das instâncias anteriores e consolidou que a multa permanece válida, reforçando a impossibilidade de flexibilização da lei para situações processuais já encerradas à época de sua aplicação.
Relembre o caso Valério Luiz
O assassinato do radialista esportivo Valério Luiz de Oliveira, ocorrido em 5 de julho de 2012, tornou-se um dos episódios mais emblemáticos e controversos da crônica policial e judicial de Goiás. Valério, conhecido por comentários incisivos e críticas contundentes ao desempenho e à gestão do Atlético Goianiense, foi morto a tiros ao sair da emissora onde trabalhava, no Setor Serrinha, em Goiânia.
As investigações da Polícia Civil apontaram que o crime foi encomendado. O principal acusado, Maurício Borges Sampaio — empresário, ex-dirigente do Atlético-GO e então vice-presidente do clube — foi apontado como mandante. Segundo o Ministério Público, o homicídio teria sido motivado pelo descontentamento de Sampaio com críticas feitas por Valério sobre sua atuação na gestão do clube.
Outros quatro envolvidos foram denunciados pelo MPGO, incluindo o suposto executor e intermediários do crime. O caso seguiu por uma longa trajetória processual, marcada por recursos, anulações, debates sobre competência e impugnações de jurados, o que atrasou significativamente o julgamento definitivo.
O Tribunal do Júri só avançou de forma efetiva uma década depois, com a realização de sessões em 2022. Durante um desses julgamentos, a defesa de Sampaio abandonou o plenário, originando a multa posteriormente analisada e confirmada pelo STJ.
A morte de Valério Luiz gerou forte repercussão nacional, mobilizou entidades de imprensa e acendeu debates sobre violência contra comunicadores, liberdade de expressão e retaliações a críticas esportivas no país. A família do radialista segue ativa na cobrança por justiça e pela preservação da memória do profissional, que deixou marca relevante no jornalismo esportivo goiano.
Tags: #Justiça #STJ #CasoValérioLuiz #DireitoPenal #TribunalDoJúri #Goiás

