PEC propõe jornada de quatro dias e divide opiniões no Brasil
Proposta da deputada Erika Hilton para reduzir a carga semanal enfrenta resistência de empresários e especialistas, mas ganha apoio entre defensores da flexibilização do trabalho.
Uma nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP), quer transformar a jornada de trabalho brasileira, propondo uma semana de apenas quatro dias de trabalho. Inspirada por uma tendência global de flexibilização e melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores, a proposta já mobiliza setores empresariais, jurídicos e trabalhistas, dividindo opiniões. A medida visa reduzir o tempo de trabalho semanal para 36 horas, com um dia adicional de descanso, mas levanta questões sobre os custos econômicos e a viabilidade prática para empresas.
Impactos Econômicos e Posicionamento Empresarial
Para o presidente da Federação do Comércio de Goiás (Fecomércio), Marcelo Baiocchi, a redução da jornada pode impactar diretamente o comércio, sobretudo em atividades que dependem do fim de semana para suas maiores receitas. “Manter dois turnos para atender todos os dias exigiria duplicação de custos e poderia inviabilizar muitos negócios. Esse aumento se refletiria nos preços dos produtos, gerando inflação e possivelmente redução de vagas, impactando negativamente a economia e os consumidores finais”, argumenta Baiocchi. Ele defende que a legislação atual, que permite convenções coletivas para negociações trabalhistas, já oferece flexibilidade suficiente e considera que novas interferências na lei trabalhista poderiam prejudicar as relações entre empregadores e empregados.
Rubens Fileti, presidente da Associação Comercial, Industrial e de Serviços do Estado de Goiás (Acieg), também vê a proposta com cautela. Para ele, o maior desafio das empresas atualmente não está na redução de horas trabalhadas, mas sim na capacitação de profissionais qualificados para atender às demandas específicas de cada setor. “Embora existam estudos que sugerem que uma jornada de quatro dias possa aumentar a produtividade, há também resultados contrários. Testar esse modelo sem ampla discussão pode gerar insegurança econômica e desincentivar novos negócios”, pondera Fileti.
Argumentos Trabalhistas e Jurídicos
A diretora do Instituto Goiano de Direito do Trabalho (IGT), advogada Juliana Mendonça, considera que a proposta tem pouca chance de avançar no Congresso. Segundo ela, o atual contexto de flexibilização das leis trabalhistas não é favorável a uma mudança tão ampla e definitiva. “A realidade que enfrentamos é de aumento da informalidade e dos baixos salários. Em muitos casos, trabalhadores que enfrentam dificuldades acabam prestando serviços sem os direitos garantidos pela CLT. A proposta da PEC pode ser bem-intencionada, mas não endereça a questão central da qualidade do emprego e da remuneração no Brasil”, analisa.
Ernane Nardelli, advogado trabalhista, compartilha da mesma visão e ressalta que a proposta poderia estimular uma “regulamentação da informalidade”. Para ele, as pequenas e médias empresas seriam as mais afetadas, enfrentando dificuldades para absorver o impacto financeiro da mudança. “Se a carga horária é reduzida, o custo da operação cresce, o que inevitavelmente é transferido ao consumidor. Não é viável para grande parte do comércio e serviços, que precisam de uma equipe fixa ao longo da semana para manter a operação ativa”, comenta.
O Debate no Congresso e Entre Parlamentares
No Congresso, a PEC enfrenta uma divisão clara de opiniões. O deputado Daniel Agrobom (PL) acredita que a proposta, embora popular nas redes sociais, não encontrará apoio suficiente entre os parlamentares. Ele defende uma alternativa baseada na livre negociação entre empregadores e empregados, onde se acordaria o número de dias trabalhados e a remuneração correspondente. “Esse modelo, mais comum em economias desenvolvidas, permite um ajuste personalizado das jornadas, beneficiando as duas partes sem a necessidade de uma intervenção legislativa ampla”, argumenta Agrobom.
Por outro lado, o deputado Rubens Otoni (PT) vê a proposta como uma oportunidade para avançar nas discussões sobre qualidade de vida e saúde mental dos trabalhadores. Ele acredita que uma jornada reduzida pode permitir que os trabalhadores invistam em sua formação e convivência familiar, fatores que podem melhorar o desempenho no longo prazo. “Embora o Congresso seja conservador em relação a mudanças trabalhistas, é importante iniciar um debate que acompanha tendências internacionais de humanização e flexibilidade no trabalho”, avalia.
Perspectivas e Próximos Passos
A proposta de Erika Hilton ainda precisa de 171 assinaturas para ser discutida no Congresso. Até o momento, estima-se que cerca de 100 parlamentares tenham aderido, mostrando uma receptividade limitada. Hilton, contudo, afirma que o verdadeiro objetivo da PEC é ampliar o debate sobre a jornada de trabalho no Brasil, acompanhando um movimento global em direção a jornadas mais curtas. Países como Islândia e Nova Zelândia já experimentaram projetos piloto que reduziram a jornada sem impacto negativo na produtividade.
Embora a aprovação da PEC ainda esteja distante, a discussão promete trazer novos olhares sobre a organização do trabalho e os modelos de produtividade no Brasil. A PEC da jornada de quatro dias semanal gera dúvidas e entusiasmos e pode sinalizar um primeiro passo para a modernização das relações trabalhistas, mas ainda precisará superar um cenário de resistência e preocupações com os impactos econômicos e sociais.
Tags: #JornadaDeTrabalho #PEC #MercadoDeTrabalho #Flexibilidade #Economia #DireitosTrabalhistas