Ameaças em Pirenópolis: Chefe do Iphan é intimidada por fiscalizar obras irregulares em imóveis tombados
Arquiteta Eliza Borges de Castro denuncia ameaças de morte após autuar intervenções não autorizadas em patrimônio histórico; Polícia Federal investiga o caso
A cidade de Pirenópolis, conhecida por sua herança colonial e importância cultural, se vê agora no centro de uma grave denúncia que abala a preservação do patrimônio histórico brasileiro. A arquiteta Eliza Borges de Castro, chefe do escritório do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) no município, foi ameaçada de morte por dois moradores locais, após fiscalizações que apontaram intervenções ilegais em imóveis tombados.
O caso foi confirmado pelo superintendente do Iphan em Goiás, Gilvane Felipe, que classificou a ameaça como um ataque direto ao Estado e à integridade de uma servidora pública em exercício legítimo de sua função.
“É inadmissível que uma profissional, no cumprimento do dever de proteger o patrimônio histórico nacional, seja exposta a esse tipo de violência. É um crime grave”, afirmou Gilvane à imprensa.
Fiscalização motivou intimidações
Segundo o superintendente, os autores das ameaças seriam dois proprietários distintos de casarões históricos, que estariam realizando modificações estruturais nos imóveis sem qualquer autorização do Iphan — o que caracteriza violação à legislação federal de preservação do patrimônio.
Eliza teria sido confrontada pessoalmente em ocasiões diferentes por ambos os suspeitos. O Iphan registrou denúncia formal à Polícia Federal (PF), que assumiu a investigação e já intimou os envolvidos. Os agentes também realizaram diligências no escritório do órgão em Pirenópolis e nos endereços dos suspeitos nesta quarta-feira (21).
A PF confirmou a realização das diligências e, embora não tenha fornecido detalhes por se tratar de investigação em andamento, indicou que os depoimentos dos dois investigados estão agendados para sexta-feira (23). A vítima foi ouvida nesta quinta-feira (22), na sede da PF em Goiânia.
Contexto e patrimônio sob ameaça
Embora não haja conexão direta com o polêmico episódio da demolição de um casarão centenário no início de maio, o caso revela um cenário preocupante: o avanço de interesses privados sobre bens públicos de altíssimo valor histórico e simbólico.
Pirenópolis, tombada como Patrimônio Histórico Nacional desde 1989, é considerada pela Unesco um dos mais ricos acervos do Brasil Central, com seus casarões coloniais, ruas de pedra e igrejas do século XVIII compondo um conjunto arquitetônico, urbanístico e paisagístico singular.
Esse tipo de agressão — tanto física quanto simbólica — ao patrimônio cultural brasileiro reforça a urgência de proteger os profissionais da área e endurecer a fiscalização e penalização de quem atenta contra a memória coletiva.
Clima de tensão e omissão pública
Fontes ouvidas pela reportagem, sob condição de anonimato, relatam que há um ambiente crescente de hostilidade entre parte da elite local e órgãos de fiscalização federal, especialmente em função de interesses econômicos envolvendo reformas de imóveis para uso comercial, como pousadas e restaurantes.
Há ainda denúncias de conivência ou omissão de setores da política local, que preferem ignorar os limites legais do tombamento em nome de investimentos turísticos — frequentemente à revelia das normas estabelecidas pelo Iphan.
A reportagem buscou contato com as defesas dos dois investigados, mas até o momento não obteve retorno. O caso segue sob investigação da Polícia Federal, que poderá indiciar os suspeitos por ameaça, coação no curso do processo e outros crimes previstos no Código Penal.
Patrimônio ameaçado, democracia também
A preservação do patrimônio histórico não é apenas uma questão estética ou turística. É uma política pública essencial à identidade cultural nacional. Ameaçar uma servidora por exercer essa função não é apenas um crime pessoal — é um atentado à democracia e ao Estado de Direito.
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